
Mostra ‘Nossa Terra, Nossa Voz’ chega à Spcine Play como canto de resposta de povos que tiveram territórios invadidos
Com curadoria de Carol Almeida e Kênia Freitas, mostra reúne longas e curtas de diferentes países que ficarão disponíveis na plataforma de forma gratuita por um ano.
Treze filmes de diferentes partes do mundo, com estilos e formatos variados e um objetivo em comum: mapear e aproximar histórias de luta de povos espalhados por nosso planeta pelo direito à terra. É com essa proposta ambiciosa que a mostra “NOSSA TERRA, NOSSA VOZ”, produzida pela empresa carioca Caprisciana Produções, chega no próximo dia 4 de julho ao catálogo da Spcine Play.
A seleção é formada por 5 longas e 8 curtas-metragens de diferentes países, obras em que, nas palavras das curadoras, “a demanda pela terra e a afirmação da própria voz unem-se de forma inseparável em reivindicações políticas e estéticas”. São documentários, ficções, filmes experimentais e animações que vão além da denúncia: reforçam as identidades de cada comunidade.
“A colonização, a globalização, o capitalismo financeiro se baseiam no sequestro de territórios e na despossessão dos povos. Um processo em construção por alguns séculos. Nosso desejo nessa curadoria era unir as lutas mais diversas de povos por suas terras, em filmes que apostam nas consequências políticas e estéticas dessas reivindicações”, explica a curadora Kênia Freitas.
As obras selecionadas defendem de formas poéticas o direito à terra por meio de suas narrativas visuais e criações artísticas. Da Palestina aos Andes colombiano, passando pelo território Maxakali (entre os hoje denominados estados de Minas Gerais e Bahia, no Brasil); do México à zona da mata pernambucana, passando Favela da Prainha, no Guarujá/SP; do mar haitiano aos campos agrícolas do Mali, passando pela luta do Movimento Sem Terra, no sul de Goiás.
O Brasil aparece em filmes que mapeiam lutas de populações nativas na zona da mata de Pernambuco (Acercadacana, de Felipe Peres Calheiros), no litoral paulista (Estamos Todos Aqui, de Chica Andrade e Rafael Mellim) e no sul de Goiás (Chão, de Camila Freitas), que a mostra relaciona com outras vivências. “Outra intenção em nosso gesto curatorial foi tentar pensar essas expressões políticas e estéticas do cinema a partir de territórios que, em comum, têm uma longa relação com violências coloniais. Quais as respostas em linguagem fílmica que diretoras e diretores da Palestina, da Colômbia, do Mali e de aldeias aborígenes na Austrália e aldeias indígenas no Brasil estão produzindo?”, completa Carol Almeida.
Com olhar atento ao público infantil, dois delicados filmes integram a seleção: a animação brasileira “Mãtãnãg, a Encantada” (2019), de Shawara Maxakali e Charles Bicalho, que busca a ancestralidade em mitos e narrativas que estão na fundação do povo Maxakali e o palestino “Um Filme Curto Sobre Crianças” (2023), de Ibrahim Handal, que usa a imaginação infantil para desafiar fronteiras.
Entre as reflexões engajadas e/ou poéticas propostas sobre comunidades que tiveram seus territórios ancestrais invadidos ou que foram expulsas deles em processos colonizatórios ostensivos, a população palestina ganhou atenção especial. Além do curta de Ibrahim Handal, cabe destacar “Ouroboros” (2017), de Basma Alsharif, que usa a montagem reversa para produzir a sensação de “eterno retorno” e “Seu Pai Nasceu com 100 Anos, assim como o Nakba” (2017), curta experimental de Razan Al Salah, que reconstrói mapas de uma história com a ajuda de arquivos e da tecnologia.
Os filmes da mostra, que estreia no dia 04/07/25, ficarão disponíveis durante um ano no catálogo da Spcine Play.
Programação:
A Concha que Chora (Le cri du lambi, Canadá, Haiti, 2017)
Direção: Vincent Toi
Sinopse: Inspirado pela figura histórica de François Mackandal, famoso sacerdote e sujeito escravizado no Haiti do século XVIII, o filme faz uma elaboração poética sobre as marcas do passado colonial na sociedade haitiana.
Duração: 20 minutos
Classificação indicativa: 14 anos
Acercadacana (Acercadacana, Brasil, 2010)
Direção: Felipe Peres Calheiros
Sinopse: Nos anos 1990, com a valorização do etanol e a expansão do latifúndio canavieiro, 15 mil famílias foram expulsas dos seus sítios na zona da mata de Pernambuco, por séculos ocupada por grandes latifúndios de antigos senhores de engenho. Mas bem ali no meio, criando um enclave de vontade de vida, Maria Francisca decidiu resistir.
Duração: 20 minutos
Classificação indicativa: Livre
Chão (Chão, Brasil, 2019)
Direção: Camila Freitas
Sinopse: Com mais de 600 famílias sem-terra, o filme acompanha a ocupação de uma fazenda de cana-de-açúcar em Goiás e as estratégias de resistência do movimento social.
Duração: 112 minutos
Classificação indicativa: 10 anos
Eles Vêm Aí! (¡Allá Vienen!, México, 2018)
Direção: Ezekiel Reyes
Sinopse: O filme usa o poema “Los Muertos”, de Maria Rivera, para dar testemunho histórico de como acontecem discursos de normalidade em tempos de guerra. É um grito visual pela luta dos subjugados e das memórias que a sociedade finge não escutar.
Duração: 8 minutos
Classificação indicativa: 18 anos
Estamos Todos Aqui (Estamos Todos Aqui, Brasil, 2018)
Direção: Chica Andrade e Rafael Mellim
Sinopse: Rosa é expulsa de casa e precisa construir seu próprio barraco. Mas enquanto ela faz os seus corres para erguer qualquer teto, um projeto de expansão imobiliária é desenhado no território do maior porto da América Latina. O projeto, o trem, as falsas promessas de desenvolvimento avançam, não só sobre Rosa, mas sobre todos os moradores da Favela da Prainha.
Duração: 20 minutos
Classificação indicativa: 12 anos
Mãtãnãg, a Encantada (Mãtãnãg, a encantada, Brasil, 2019)
Direção: Shawara Maxakali e Charles Bicalho
Sinopse: Mãtãnãg segue o espírito do marido morto até a aldeia dos mortos, cruzando mundos sob a ótica espiritual Maxakali.
Duração: 14 minutos
Classificação indicativa: Livre
Nũhũ Yãg Mũ Yõg Hãm: Essa Terra É Nossa! (Nũhũ Yãg Mũ Yõg Hãm: Essa Terra É Nossa!, Brasil, 2020)
Direção: Isael Maxakali, Sueli Maxakali, Carolina Canguçu, Roberto Romero
Sinopse: Os Maxakali narram, em primeira pessoa, o impacto da presença dos brancos em suas terras, guiados pelos yãmiyxop, espíritos ancestrais.
Duração: 70 minutos
Classificação indicativa: Livre
Nossa Voz de Terra, Memória e Futuro (Nuestra voz de tierra, memoria y futuro, Colômbia, 1981)
Direção: Marta Rodriguez, Jorge Silva
Sinopse: Clássico do Novo Cinema Político Latino-Americano que registra a fundação do CRIC e a luta indígena por cultura, território e direitos.
Duração: 90 minutos
Classificação indicativa: 12 anos
Ouroboros (Ouroboros, França, Palestina, Bélgica, Catar, 2017)
Direção: Basma al-Sharif
Sinopse: A premissa nietzschiana do “eterno retorno” se alia ao conceito de “tempo perturbado” da Palestina, em Edward Said, para mover esse filme em círculos onde todo fim é também um começo. Um tributo experimental à Gaza a partir dos seus escombros e da impossibilidade de pensar o tempo nos termos de passado, presente e futuro quando a máquina do progresso só consegue destruir o que se encontra diante dela.
Duração: 77 minutos
Classificação indicativa: 12 anos
Quando os Cães Falavam (When the Dogs Talked, Austrália, 2014)
Direção: Karrabing Film Collective
Sinopse: Enquanto um grupo de adultos indígenas discute sobre manter o seu conjunto habitacional ou salvar o seu território sagrado, seus filhos lutam para decidir como os lugares ancestrais (Dreaming) fazem sentido em suas vidas contemporâneas. O filme mistura documentário e ficção para produzir um drama reflexivo, porém bem-humorado sobre os obstáculos diários da pobreza estrutural e racializada e sobre a dissonância de formas narrativas culturais e sociais.
Duração: 34 minutos
Classificação indicativa: 12 anos
Seu Pai Nasceu com 100 anos, assim como o Nakba (Your Father Was Born 100 Years Old and So Was the Nakba, Estados Unidos, Líbano, Palestina, 2017)
Direção: Razan AlSalah
Sinopse: Oum Amin, uma avó palestina, retorna à sua casa em Haifa a partir do Google Maps street-view, pois essa é a única maneira que ela tem de poder voltar ao seu lar. Onde está Amin nesse mapa? Onde estão as fraturas nesse mapa?
Duração: 7 minutos
Classificação indicativa: Livre
Um Filme Curto Sobre Crianças (A Short Film About Kids, Palestina, 2023)
Direção: Ibrahim Handal
Sinopse: Na Palestina ocupada, um grupo de crianças da Cisjordânia traça um plano mirabolante para conhecer o mar, enfrentando fronteiras reais e imaginárias com criatividade e coragem.
Duração: 10 minutos
Classificação indicativa: Livre
Xaraasi Xanne (Vozes Cruzadas) (Xaraasi Xanne (Crossing Voices), França, Alemanha, Mali, Senegal, 2022)
Direção: Raphaël Grisey & Bouba Touré
Sinopse: A partir de arquivos raros, o filme narra a criação da cooperativa agrícola Somankidi Coura, fundada em 1977 no Mali por migrantes da África Ocidental. A história ilumina lutas ecológicas e utopias de retorno à terra no Sahel (que atravessa o norte da África do oceano atlântico até o mar vermelho).
Duração: 103 minutos
Classificação indicativa: Livre
