Entrevistas,  Televisão

The Last of Us: entrevista com elenco e criadores

Depois de mais de dois anos de espera desde o desfecho da primeira temporada, The Last of Us retorna no dia 13 de abril. O seriado foi criado por Craig Mazin e é roteirizado por ele e Neil Druckmann, responsável pela franquia de videogame de mesmo nome que serve de inspiração para o programa.

Na primeira temporada vemos uma epidemia de fungos que se instalam nos corpos humanos e passam a controlá-los. O surto aconteceu em 2003 e, depois da morte de milhares de pessoas, a trama se desenrola em 2023, quando fiapos de sociedades tentam manter seus grupos vivos em condições ainda inóspitas. Ellie (interpretada por Bella Ramsey) é uma menina de 14 anos que já foi mordida (mais de uma vez) por pessoas infectadas e nunca desenvolveu a doença. Joel (vivido por Pedro Pascal) perdeu sua própria filha no começo da epidemia e ocupa o lugar de figura paterna.

No desfecho da temporada anterior, Joel havia matado dezenas de pessoas para salvar Ellie. Eles haviam chegado em um hospital dos Vagalumes, uma espécie de grupe de resistência, em que a menina seria testada, para que talvez o que provoque sua imunidade pudesse ser usado para produzir uma cura ou vacina para a contaminação.

Agora cinco anos se passaram e eles vivem instalados, como pai e filha, no vilarejo onde reside o irmão de Joel, Tommy (Gabriel Luna) e sua esposa, Maria (Rutina Wesley). Ellie não fala mais com ele e se mudou para a garagem de casa. Além da nova convivência na comunidade, encarando os desafios de jovem adulta, querendo ajudar na guarda da cidade e lidando com o interesse amoroso que nutre por sua amiga Dina (Isabela Merced), além da amizade com Jesse (Young Mazino), ambos novos personagens. As relações familiares se embaralham: Ellie tem no tio um confidente e amigo, enquanto Joel consegue dialogar com Dina, ao mesmo tempo em que faz terapia com Gail (Catherine O’Hara), se abrindo para a reflexão sobre seu lugar enquanto pai.

Dina e Ellie (Imagem: divulgação)

Como fica claro, essa segunda temporada começa abrindo mais espaço para as emoções (muitas vezes conflitantes) de seus protagonistas. A sobrevivência e a ameaça fúngica continuam presentes, não sem seus sustos, mas, afinal, o que sempre importou foram os vínculos humanos. A dificuldade de criar e manter laços tentando reproduzir as estruturas sociais de um passado pré-apocalipse, quando na verdade o mundo se desmancha em turbulências, é o maior desafio.

Dito isso, o afeto ainda é inegável, e nesse sentido uma adição crucial para o elenco dessa temporada é Kaitlyn Dever (de Fora de Série), que interpreta Abby, uma jovem cujo pai foi morto por Joel cinco anos antes na fatídica fuga do hospital. Agora ela busca vingança.

No dia 28 de março de 2025 pude participar de uma entrevista coletiva com os showrunners, Craig Mazin e Neil Druckmann, bem como Bella Ramsey, Pedro Pascal, Gabriel Luna, Kaitlyn Dever, Isabela Merced e Young Mazino, em uma conversa sobre esse começo da nova temporada.

Mazin explica que foram dois anos de trabalho muito duro e ininterrupto: assim que a temporada anterior acabou, começaram a escrever a seguinte e emendaram pré-produção, filmagem e pós-produção. Ele diz estar ansioso para que o público possa ter contato com o que fizeram e que todo o pessoal ali presente está extraordinariamente orgulhoso do trabalho feito. Druckmann completa dizendo que eles têm uma equipe que deu tudo de si: “cenários incríveis, próteses e efeitos visuais, efeitos visuais sem parar. Temos uma temporada selvagem pela frente”.

A respeito da entrada de Abby, tão importante para os acontecimentos da temporada, Druckmann explica que no videogame você começa jogando com ela e por isso imediatamente forma uma conexão empática com ela, uma vez que está sobrevivendo em sua pele. “Você está correndo na neve, lutando contra infectados, e podemos reter certas informações e criar um mistério que será revelado mais tarde na história. Não podíamos fazer isso na série porque você não está jogando como ela, então precisamos de outras ferramentas”. Por esse motivo, a informação sobre o seu local de origem e suas conexões foram adiantadas para o primeiro episódio. Além disso, como essa revelação no jogo acontece muito adiante na narrativa, ele imaginou que quem assiste à série acabaria recebendo spoilers. Assim, optou por adiantar esse momento e dar aos espectadores o contexto desde o início.

Para Bella Ramsey, a volta do programa é algo assustador, mas também é positiva:

Quando a primeira temporada saiu, obviamente foi essa coisa enorme. Acho que estou muito ciente de que a segunda temporada está chegando e que todo mundo estará olhando para ela e olhando para mim, e isso é meio assustador, mas também é empolgante. Mas é bom estar aqui e tentar ver isso como uma celebração de todo o trabalho árduo que fizemos. E eu só espero que as pessoas gostem. E porque esses caras [Druckmann e Mazin] fizeram um trabalho incrível e acho que todos nós entramos nisso com total confiança neles. E fomos literalmente carregados e protegidos o tempo todo, então é muito empolgante e eu espero que, sim, as pessoas assistam. (Bella Ramsey)

Acrescenta que algumas cenas dos últimos episódios, particularmente os dois últimos, foram suas favoritas de filmar. Por sua vez, Pedro Pascal diz que é muito especial estar de volta e explica que é como se fosse “Também com uma identidade meio que expandida, se isso faz sentido. Porque há pessoas novas e há pessoas antigas” Para ele, é empolgante dar ao público outra temporada de uma série que eles amam, “na qual todos trabalharam tanto e investiram tanto”.

Gabriel Luna complementa dizendo que é bom estar de volta: “É maravilhoso ver Bella, Pedro e Rutina novamente, reunir a família. Mas também adicionar essas novas pessoas que fortaleceram a história de tantas maneiras novas e empolgantes. Eles trouxeram um grande amor pelo material original” e acrescenta que os novos rostos do elenco adicionaram o que chamou de “uma bela infusão de juventude e entusiasmo e energia”.

Kaitlyn Dever como Abbie (Imagem: divulgação)

Aproveitando a deixa da menção à chegada de novos integrantes, Mazin comenta que Kaitlyn Dever aceitou todos os desafios, mesmo físicos, que envolvem sua personagem, com um desempenho que o impressionou. A atriz tinha sido testada para o papel de Ellie cerca de 10 anos atrás, quando havia conversas de um projeto para uma adaptação em um filme, que foi abandonado. Passado tantos anos, agora escalada como Abbie, já na série, ela afirma:

Foi como sentir todas as emoções ao mesmo tempo. Eu estava nervosa, estava ansiosa, mas também muito animada. Sou uma grande fã desse jogo e da série há muito tempo. Eu joguei, foi um momento de conexão real entre mim e meu pai jogando juntos. Mas a série, o alcance desse mundo é tão, tão grande. O mundo de The Last of Us é tão vasto. Então, você definitivamente pode sentir isso, nas provas de figurino, quando está na preparação e finalmente chega ao set. Ainda parece muito grande, mas eu me senti menos nervosa quando cheguei ao set por causa desse grupo maravilhoso de pessoas e por ser amparada pelo Craig [Mazin] e pelo Neil [Druckmann]. Realmente parecia que eu estava sendo cuidada e protegida de uma forma que nunca havia experimentado antes. Foi uma grande emoção como pessoa e como atriz. Foi surreal porque realmente pareceu que as coisas que são destinadas a acontecer na sua vida acontecem se for para ser. E simplesmente deu certo. (Kaitlyn Dever)

Já Isabela Merced diz que se sentiu como a aluna nova na escola e acrescenta:

Acho que Dina e eu temos muito em comum no sentido de que eu tenho essa confiança aleatória sem motivo algum. Então eu realmente aprecio que eles me aceitaram pelo que eu sou, e eu realmente sinto que fui vista pelos olhos de vocês. Eu meio que vejo a Dina como uma extensão de mim mesma. Se eu estivesse em uma situação apocalíptica, tentaria deixar tudo um pouco mais leve. Acho que esse é nosso superpoder como humanos, temos realmente o poder de mudar nossa perspectiva e criar nossa própria realidade. E acho que a Dina é, de certa forma, a bússola e a luz da Ellie. Ao mesmo tempo, Dina também está em luto. Foi um ambiente muito bom para florescer como atriz. Acho que é por isso que minha mãe ficará orgulhosa de mim. (Isabela Merced)

Young Mazino, por sua vez, ressalta o nervosismo sentido ao perceber a escala imensa da cidade, com “aqueles portões gigantes que eles construíram. Foi quando comecei a me sentir um pouco pressionado”. Mas a sensação passou quando percebeu a energia acolhedora e convidativa do grupo: “e senti que não havia ego no set. E acho que isso é algo raro, especialmente em produções grandes. E eu me diverti muito”.

Sobre como ajustou a sua atuação com o avanço temporal, Bella destaca que a passagem dos 14 para os 19 anos que Ellie viveu corresponde aos anos formativos para qualquer adolescente. A respeito das mudanças retratadas, complementa que “Obviamente há razões mais profundas para essa pequena ruptura entre eles [Ellie e Joel]. Mas eu não gostei da sensação de estar distante do Pedro dentro de cena. Não foi uma sensação agradável”, comenta, uma vez que na “vida real”, ambos se dão muito bem. Para Pedro, por sua vez:

Há uma distância incrivelmente dolorosa entre os dois personagens na primeira cena que gravamos, só eu e Bella em um ambiente meio íntimo. Mas ainda podíamos estar no set, brincar, rir e fazer coisas assim, e isso foi incrivelmente reconfortante. Foi como voltar para casa. Minha mentalidade era de gratidão por estar de volta e, ao mesmo tempo, essa experiência, mais do que qualquer outra que tive, torna difícil separar o que os personagens estão passando do que eu estou sentindo, de uma forma que não é muito saudável. Então, meio que sinto a dor deles. (Pedro Pascal)

Dina e Joel (Imagem: divulgação)

E complementa, sobre a sensação geral de que estamos vendo um programa apocalíptico que pode se relacionar com a própria realidade atual:

Acho que o contar histórias sempre foi catártico de muitas maneiras. É a forma como os seres humanos fizeram seu testemunho da vida, seja por meio das marcas de mãos nas paredes dentro de uma caverna ou de uma série de televisão. Então, para mim, crescendo, sempre tive e todo o meu desenvolvimento se baseia nos livros que li, nos filmes que vi e nos programas de televisão que assisti. E, portanto, isso sempre vai refletir a experiência humana. E sob circunstâncias tão extremas, acho que há um tipo de prazer muito saudável e às vezes doentio nessa catarse, em um espaço seguro para ver relacionamentos humanos em crise e dor, e para inteligentemente traçar alegorias políticas, alegorias sociais, com base no mundo em que estamos vivendo e de maneira muito bonita e muito inteligente. (Pedro Pascal)

Ellie e Tommy (Imagem: divulgação)

Pascal e Luna destacam que o arco dos irmãos foi muito bem construído para eles. Eles começam o primeiro dia de pandemia da primeira temporada juntos e, por isso, desde os ensaios, construíram um vínculo que se reflete nos personagens como parceiros de cena, expresso na familiaridade e na doçura que eles emanam. Para Mazin, o processo dos dois foi respeitoso com a escrita da série e vice-versa. Relata que quando um diretor perguntava se uma fala seria mesmo necessária, ele ficava em dúvida, mas Pedro pedia para defender o roteiro como foi escrito. “Como escritor, meu coração [coloca a mão no peito] ficava… eu ficava grato”. E relata: “Esses caras pegaram essa cena e voltaram dizendo: ‘Olha, pegamos esse trecho e movemos para cá, e esse outro trecho movemos para lá’. E eu lia e pensava que tinha ficado muito melhor. Esse é o nível de atenção e cuidado, eles não estão apenas brincando”.

Perguntados sobre que palavras escolheriam para definir a segunda temporada de The Last of Us, Mazino responde “Explosiva”; Dever diz “Envolvente”; Merced fala “Luto” e Luna descreve “Vingança”. Mais sensoriais, Pascal diz “Nevada” e Ramsay complementa “Chuvosa”. Druckmann, por sua vez, destaca o sentimento “Amor” e Mazin resume: “Linda”.


A segunda temporada de Last of Us estreia no Brasil em 13 de abril no streaming Max.


Agradeço a Warner Bros. Discovery pelo envio do screener e a HBO pela oportunidade de entrevista, realizada em ambiente virtual e editada visando melhor clareza.

Crítica de cinema, doutora em Antropologia Social, pesquisadora de corpo, gênero, sexualidade e cinema.

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *