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Copa 71 (2023)

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Você já ouviu falar da Copa do Mundo de 1971 de Futebol Feminino? Não? Pois é, eu também não tinha. Foi com espanto que assisti ao documentário chamado Copa 71, dirigido por Rachel Ramsay e James Erskine, que relata os acontecimentos em torno do evento esportivo. Na época, futebol feminino era proibido em grande parte do mundo, incluindo no Brasil, onde só foi liberado em 1979. Isso significava que meninas e mulheres não poderiam jogar em clubes ou eventos oficiais, mas não queria dizer que não jogassem nas ruas ou em campos de bairro. Os argumentos, logo no começo do século 20, eram médicos: a prática poderia prejudicar o útero das jogadoras. A medicina tinha seu viés e, posteriormente, os interesses políticos e econômicos mantiveram a prática no ostracismo: a Fifa só regulamentava a participação masculina.

Apesar disso, após o enorme sucesso da Copa do Mundo Masculina de 1970, que aconteceu no México e e foi transmitida em cores pra todo mundo e onde o Brasil se sagrou tri-campeão, um grupo de empresários pensou que poderiam aproveitar toda aquela estrutura de estádios e de mídia e repetir o sucesso com mulheres no ano seguinte. Convites foram enviados para aqueles países em o futebol não era mais proibido e, embora não existissem ainda seleções, jogadoras foram escolhidas para compar. Aceitaram participar os times da Inglaterra, Argentina, Itália, Dinamarca, França e da própria casa, México. Eles foram organizados em dois grupos de três, sujos classificados foram encaminhados diretamente para as semifinais.

O documentário conta com depoimentos de jogadoras de todas as seleções, relatando os recursos, os patrocinadores, a torcida acalorada, as aparições midiáticas, as partidas, enfim, tudo que envolveu a fama instantânea com que foram recebidas. Mas a montagem, dinâmica, usa também de diversas filmagens das partidas e outros eventos. Dessa maneira, os principais momentos de todo o torneio são analisados por pontos de vista de times rivais, ao mesmo tempo que é possível testemunhar esses acontecimentos. Na sala de cinema, as pessoas assistindo riam com as tiradas espirituosas das ex-jogadoras e vibravam a cada gol marcado, como se fosse ao vivo. O filme consegue conferir intensidade àquilo que registra.

Nomes como Serena e Venus Williams entre os produtores podem explicar o epilogo anticlimático, amarrando a narrativa das pioneiras do passado com jogadoras estadunidenses, país que não participou do evento e que não tem nenhuma relação direta. Algumas ex-jogadoras do país dão depoimentos reforçando que não conheciam essa Copa do Mundo e a importância de trazer essa história para um público maior. Se ideia era criar uma espécie de linha do tempo ou demonstrar o seu legado, faria mias sentido trazer falas de mulheres de diferentes origens, incluindo os países participantes. Marta, por exemplo, que foi a melhor jogadora do mundo pela FIFA por cinco anos, aparece brevemente em imagens, mas seu nome sequer é mencionado.

De qualquer forma o conjunto apresentado no documentário gera perplexidade. A estrutura contribui para criar simpatia pelas jogadoras do passado, seus feitos e sua batalha por reconhecimento e causa assombro o esquecimento a que foram relegadas. Até hoje hoje a final do campeonato é o recorde em um evento de futebol feminino, com mais de 110 mil pessoas lotando o estádio Azteca, na Cidade do México. O evento, por não ser organizado pela FIFA, não é reconhecido e considera-se que a primeira Copa do Mundo de Futebol Feminino aconteceu em 1991. Copa 71 informa, diverte e emociona muito trazendo uma história que ficou esquecida, mas que, claramente, ainda vive e ressoa forte nos corações daquelas que a viveram.

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Crítica de cinema, doutora em Antropologia Social, pesquisadora de corpo, gênero, sexualidade e cinema.

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