
[Tribeca 2025] Entrevista – Ana Luz Zambrana, atriz e co-roteirista de A West Side Story Story (2025)
Este texto faz parte da cobertura do Tribeca Film Festival 2025, que ocorre entre 4 e 15 de junho.
Em 2021, Steven Spielberg lançou uma nova versão de Amor, Sublime Amor. O musical que reconta Romeu e Julieta como uma história de amor proibido entre uma jovem porto-riquenha e um rapaz estadunidense coloca o romance em um cenário de briga de gangues em Nova York. O sucesso pode não ter sido o mesmo que o do filme de 1961, mas Ariana DeBose igualou Rita Moreno e ganhou um Oscar de atriz coadjuvante pelo desempenho como Anita, a cunhada da protagonista que exalta a segunda chance que vive nos Estados Unidos, mesmo com o preconceito de quem nasceu lá e tem origens europeias.
A volta de Amor, Sublime Amor aos cinemas colocou de novo a obra em debate, tanto pela representação dos porto-riquenhos quanto pela escolha do elenco que interpreta esses personagens. É nessa conversa que nasceu o curta A West Side Story Story, do diretor Aditya Joshi, que integra a programação do Festival de Tribeca em 2025. No filme, uma diretora de teatro tenta montar uma versão da obra. A honra à avó porto-riquenha guia os 12 minutos da produção, como contou Ana Luz Zambrana ao Feito Por Elas. Protagonista, co-roteirista e produtora do curta, ela conversou com a Camila Henriques via Zoom antes da primeira exibição do filme em Tribeca.
Camila Henriques: Como a sua experiência enquanto mulher latina se encaixou no filme?
Ana Luz Zambrana: Esse filme nasceu da minha experiência de ser uma mulher latina. Eu nasci na Dakota do Sul, mas minha família é de Porto Rico, e eu viajo pra lá desde que eu era criança, desde que nasci. Minha experiência com a diáspora e com a minha identidade, do que é ser latina e o que significa ser latina não se encaixava nos estereótipos que a gente vê na mídia. Eu queria ver algo que nos mostrasse em uma perspectiva diferente e que representasse mulheres latinas como eu, como minha irmã ou a minha mãe. Eu queria ver algo que dialogasse com a minha avó. E eu sou atriz, faço muitos testes e eu não vejo tantos papéis que reflitam a minha experiência. Eu também sou diretora de teatro em Nova York e eu queria ver algo que refletisse não apenas a mim, mas às outras mulheres ao meu redor. Foi por isso que quisemos criar algo que aparecesse em um filme como o nosso, por essa necessidade de ver autenticidade na representação das latinas na TV e no cinema.
Camila: O filme mostra os bastidores de uma montagem teatral de Amor, Sublime Amor, que é uma obra que motiva debates sobre representação e representatividade há décadas. O primeiro filme de 1961 tinha a Rita Moreno, um grande ícone de Porto Rico, mas também tinha a Natalie Wood, uma ótima atriz mas que não fazia parte daquela cultura. Depois tivemos a versão do Spielberg, sem falar nas montagens teatrais. Queria que você falasse sobre a escolha de Amor, Sublime Amor e a importância de contar essa história com atores latinos, porto riquenhos em especial.
Ana: Nós escolhemos Amor, Sublime Amor pela minha herança porto riquenha, por toda a interação que eu tive com essa obra na minha vida. Por exemplo, meu pai, ele cresceu com o filme de 1961. Ele chora quando assiste. É algo que o emociona, que significa muito pra ele. E, pra mim, também significa muito. Eu me via ali, mas tinha uma separação no tempo. Já a minha irmã mais nova nunca nem assistiu. Então existe essa interação que a gente queria colocar no filme. Como você disse, já vimos essa história ser recontada, e ela continuar sendo a imagem dos latinos na mídia. E isso é ótimo, porque abriu muitas portas pra gente. Mas eu também me pergunto onde está o debate sobre isso. E encontramos, com o filme, uma forma de expandir essa conversa, mostrar como a obra dialoga com a gente. É por isso que era tão importante ter Amor, Sublime Amor no filme. E também é uma obra muito icônica para a nossa história. A trilha é linda. É também uma carta de amor a Porto Rico, de certa forma. Por isso, quisemos fazer esse curta. Tenho muito orgulho das minhas origens. Muito orgulho de ser porto riquenha, muito orgulho da minha família e da nossa história. E acho que não há tanto disso em Amor, Sublime Amor. E foi algo que eu quis mostrar, por isso escolhemos essa obra. Sem falar em toda a nuance que há ali. Eu espero que os debates sobre a obra continuem, e que possamos expandir as conversas.
Camila: Há um momento no curta em que o plano sequência quebra para vermos a avó da diretora. Ela aparece com o vestido icônico da Maria, branco e vermelho. Esse filme também fala de herança, das pessoas que migraram décadas atrás. Quero que você fale sobre a escolha de ter a avó como parte da história e também o final do curta, que tem um momento seu bem bonito olhando pro espelho como quem diz que o show deve continuar por ela.
Ana: Você vai me fazer chorar. Eu sou fácil de chorar. Mas sim, sobre a decisão de incluir a avó, foi porque nós queríamos que fosse sobre uma diretora de teatro porto riquenha, tentando montar uma versão autêntica de Amor, Sublime Amor. Eu sou diretora de teatro e sou porto riquenha, e é algo que eu falei com meu parceiro, que escreveu o roteiro comigo e dirigiu o filme, Aditya Joshi. Eu sinto a necessidade de fazer isso? Eu faço isso por mim, mas também pela minha irmã, também pela minha mãe. Eu faço pela minha avó. E quanto você tem essa pressão, esse peso que é colocado nos artistas latinos… Você quer honrar a sua família, a sua cultura. E qual a melhor forma de representar visualmente isso do que a avó da personagem? Ela surge também como um conforto pra que a personagem sinta que, mesmo estressada, ela está fazendo aquilo pelo povo dela, pela família dela. Essa figura da avó é perfeita pra enraizar a nossa protagonista, pra que ela lembre do porquê fazer aquilo E no final, sem dar muito spoilers, temos aquele momento dela pensando na avó porque, no fim do dia, a vida acontece, pessoas morrem, as coisas ficam difíceis, mas o show precisa continuar. Precisamos lembrar por quem fazemos o que fazemos, qual o nosso propósito e precisamos seguir em frente por essas pessoas, pelo nosso povo, pela nossa família e também por nós mesmos. Fico feliz que você sentiu esse momento ao assistir porque, pra mim, como atriz, é algo que estava na minha cabeça.
Camila: A gente vê as coisas dando errado, a bandeira de Porto Rico rasgando… Gosto muito como o filme mostra também esse caos dos bastidores do material, da pressão não apenas pela obra, mas também por ser uma apresentação ao vivo. Você pode falar um pouco sobre como foi imprimir toda essa intensidade em 12 minutos de filme.
Ana: Sim, isso é algo muito importante pra gente, porque eu dirijo teatro latino e é algo insano. Eu queria que fosse ainda mais louco, mas a gente tinha apenas 12 minutos de filme. É bem caótico e selvagem. Como a gente mostra isso em 12 minutos? Então a gente trouxe alguns momentos, como a bandeira e o problema das saias, mas algo importante pra mim era a trilha sonora. A gente precisava disso porque não dá pra ser só o visual. É um curta. A gente não tem o orçamento pra mostrar tudo o que gostaria, então como enfatizar o que está se passando com a protagonista? Por isso, a trilha era algo que precisava ajudar nesse processo, fazendo com que a gente entre na mente da protagonista sem precisar de diálogos expositivos. Tivemos um compositor incrível trabalhando no filme, Christian Quiñones, que fez um trabalho maravilhoso. É, então, o elemento que mais ajudou a mostrar a pressão e a ansiedade na cabeça da nossa protagonista foi a trilha sonora.Foi algo que ajudou a gente a mostrar que aquilo era muito grandioso para ela.
Camila: O filme dialoga também com o clima atual nos Estados Unidos, com a política de imigração do atual governo, esse processo de décadas que agora parece andar pra trás. O quão importante pra você é lançar esse filme agora, principalmente em um festival de cinema em Nova York?
Ana: É muito importante. É um filme que fala com o tempo atual. É importante, principalmente se a gente pensar em uma lente de que vai tudo ficar bem. Se nós continuarmos em contato com as nossas raízes, com o que nos alegra, que costuma ser a nossa comunidade e a nossa família, que é do que esse filme fala. Vamos nos conectar a isso. Nós, latinos, somos resilientes. Já provamos que somos resilientes. Nós vamos conseguir seguir em frente se estivermos juntos.
Camila: Pra encerrar, queria que você falasse como sente que os latinos estão sendo representados na TV e no cinema. Estamos vendo uma mudança com a escolha de atores e atrizes com as etnias que correspondem aos papéis, mas ainda vemos problemas. Você é atriz, faz testes e também é diretora. Como avalia isso?
Ana: Precisamos fazer as nossas próprias histórias. Fazer testes é ótimo, ter outras pessoas criando papéis pra gente é ótimo. Eu adoro fazer testes, mas a gente precisa ver histórias criadas pelo nosso próprio povo, porque a gente consegue sentir a diferença.
