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[Tribeca 2025] Yanuni

Este texto faz parte da cobertura do Tribeca Film Festival 2025, que ocorre entre 4 e 15 de junho.


Filme de encerramento do Festival de Tribeca, Yanuni tem seu nome emprestado da representação física do sonho que a protagonista expressa ao longo do documentário dirigido pelo austríaco Richard Ladkani. A liderança indígena Juma Xipaia vive uma vida de lutas pelos direitos dos povos originários. Entre os desmandos do governo genocida de Jair Bolsonaro e a esperança com a volta de Luiz Inácio Lula da Silva à Presidência (e a subsequente criação do Ministério dos Povos Indígenas), o filme mostra, na figura de Juma, a resistência das mulheres indígenas. 

Confesso que, ao ver que era um filme dirigido e produzido por estrangeiros que não vivem aqui – um deles, Leonardo DiCaprio -, fiquei com medo de ver um olhar exotizado. No entanto, o filme pende mais para o didatismo em sua primeira meia hora. Com o intuito de mostrar o horror dos anos Bolsonaro, Ladkani faz um apanhado do impacto negativo daquele período, sobretudo nas políticas ambientais, principalmente pelo olhar da imprensa internacional. 

É nesse contexto de terra arrasada (literalmente) que encontramos Juma. Sobrevivente de seis tentativas de assassinato, ela sonha em um dia viver na paz de sua terra, com seu povo. Mas a luta não espera e nem cessa. Yanuni não é o primeiro filme que reconta a angústia das eleições de 2022, e nem o primeiro a fazer pelo olhar estrangeiro. Para citar como exemplo, me atenho a dois que assisti No Céu da Pátria Nesse Instante, de Sandra Kogut, e Lula, de Oliver Stone. O primeiro, uma decepção por falar de um Brasil que não representa o Brasil (mesmo sendo uma tentativa de mostrar o olhar da esquerda, é bem preconceituoso e raso). O segundo, por falar de quem fala, é previsivelmente festivo (e confesso que arranca umas lágrimas ao conseguir retratar toda a tensão daquele 30 de outubro). No filme de Ladkani, aquele dia é um degrau para uma conquista significativa, com a criação de um Ministério dedicado aos povos originários, comandado por Sônia Guajajara. 

São ventos de esperança que não apagam a dúvida, que o diretor consegue retratar com mais segurança na segunda metade do filme. “Será que estamos sendo tolos em sermos otimistas?”, Juma indaga. Quando ela entra no prédio do Ministério para o primeiro dia de trabalho como secretária de Articulação e Promoção de Direitos Indígenas, ela carrega também os sonhos de uma população que vê, todos os dias, seus parentes dizimados em nome do que poderosos chamam de “progresso”. O filme contrapõe a agitação dos flashes que a cercam na COP26, em Glasgow, com a calmaria da floresta, que a abraça e a acolhe como alguém que sabe que qualquer debate sobre mudanças climáticas precisa incluir os povos originários. 

A urgência de discutir a devastação ambiental é presente mesmo nesses momentos mais calmos, em que vemos Juma com o filho e o companheiro, que atua no Ibama em operações de combate à grilagem. Os sentimentos conflitantes entre seguir na cidade, lutando pelos povos da floresta, e voltar ao lugar que, nas próprias palavras dela, a cura, pairam sobre o longa. A esperança é, de fato, o sentimento ao qual o filme retorna, para lembrar que essa luta também pode ser renovada no olhar de uma criança. Yanuni, enfim, vem ao mundo e Juma reinventa seus propósitos. Ela escolhe ficar com seu povo e deixar de ter suas energias sugadas pela cidade. A luta vai continuar após os créditos do filme rolarem.

Crítica de cinema, membra da Abraccine, amazonense, 30+, ama novela mexicana

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