Críticas e indicações,  Filmes

Amor por “whodunnit”e Glass Onion

Texto publicado originalmente na newsletter para assinantes do financiamento coletivo do Feito por Elas.


Eu sou doida por histórias de detetive estilo whodunit, o termo intraduzível usado pra identificar o subgênero de narrativas em que um crime acontece e uma pessoa (ou pessoas) tenta descobrir quem foi o responsável. Ainda na minha pré-adolescência eu devo ter devorado por baixo uns 40 livros da Agatha Christie, incluindo sua autobiografia. Me deliciava com a futricagem de Miss Marple, que desvendava mistérios entre xícaras de chá. Amava o menos conhecido casal de detetives amadores Tommy e Tuppence, que envelheceram juntos ao longo dos romances. E, claro, me afeiçoei absurdamente por Hercule Poirot, o personagem cheio de manias mas genial que solucionava casos apenas usando suas “células cinzentas”. E, com isso, chorei copiosamente com Cai o Pano, livro publicado em 1975 em que a autora mata seu personagem para garantir que ele não sobrevivesse a ela, que faleceu no ano seguinte. (E ainda assim acontecem descalabros como o Assassinato no Expresso do Oriente (Murder on the Orient Express, 2027) do Kenneth Branagh em que Poirot – o horror! – troca socos com outro homem. Mas vamos fingir que isso não aconteceu).

Fiz toda essa volta pra dizer que depois do desprazer que foram os filmes do Poirot do Kenneth Branagh, foi lindo quando Entre Facas e Segredos (Knives Out, 2019), do Rian Johnson, estreou. Inclusive foi isso que falei na frase que registrei no letterboxd sobre ele. Pula pra 2022 e Glass Onion: Um Mistério Knives Out (Glass Onion: A Knives Out Mystery, 2022) chega à Netflix. É tão bom como o primeiro? Não é. Fica devendo, inclusive, no quesito suéteres, já que dessa vez a história se passa em uma ilha, com ambientação praiana Mas é divertido? Demais. E eu amo esse tipo de história mirabolante que vai descascando as camadas aos poucos (não vou pedir desculpas pelo trocadalho hahaha), entre reviravoltas e explicações. Agatha Christie ficaria feliz com o pupilo.

E tem o queer bait, né, porque o filme nos apresenta ao companheiro de Benoit Blanc (não vou dar spoiler para quem não viu ainda) de maneira super casual. E eu apenas amei! (mesmo sendo bait). Talvez ainda mais agora, depois de ter visto Maurice (1987), que atesta a perfeição da escolha.

O figurino do filme é apenas impecável. O Daniel Craig não tem exatamente o charme de Cary Grant (embora o personagem Benoit Blanc deva ser o mais charmoso que ele já interpretou), mas ainda assim ele segura bem o look inspirado em Ladrão de Casaca (To Catch a Thief, 1955), de Hitchcock. As calças de corte amplo e reto, a camisa justa e lenço amarrado no pescoço, dessa vez todos em tons pastel, não são para qualquer um. Palmas para a figurinista Jenny Eagan! Para saber mais detalhes sobre o figurino, recomendo esse texto publicado pela própria Netflix: So, You’re Obsessed with Benoit Blanc’s ‘Glass Onion’ Bathing Suit...(“Então, você está obcecade com a roupa de banho de Benoit Blanc em Glass Onion…”), escrito por Anne Cohen, que aborda mais detalhes. 

Vestir Elvis com um paletó rosa intenso e com uma camisa de renda preta com transparência, elementos emprestados da lingerie, evoca um tipo de sedução que a masculinidade tradicional não é capaz de criar. Junta com a maquiagem com olhos marcados e bam! Essa é a imagem (nada óbvia) de um homem que levava plateias à loucura em furor obviamente sexual. Catherine Martin, nunca mude! 

E por falar em figurinos, Tom & Lorenzo, do site com mesmo nome, como todos os anos elegeram os seus preferidos de 2022. Tem o vestido vermelho de Mia Goth, não em X, mas em Pearl, sua sequência. Tem o traje de banho de Benoit Blanc em Glass Onion. E tem RRRNopeElvis e vários outros filmes, incluindo alguns que ainda vão estrear (mas já fique de olho!). você pode conferir a lista aqui, parte 1parte 2 e parte 3

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Crítica de cinema, doutora em Antropologia Social, pesquisadora de corpo, gênero, sexualidade e cinema.

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