Cow
O quinto longa (e primeiro documentário) da cineasta Andrea Arnold, é, na verdade, um filme (quase) mudo de terror. Luma, a protagonista, é uma vaca leiteira em uma fazenda comum da Inglaterra. Um rápido google após o filme me informa que a expectativa de vida de uma vaca gira em torno de 20 anos, mas vacas leiteiras podem não chegar aos 8. A gestação é viável a partir dos 2 anos, mas algumas fontes defendem que aos 14 meses já é possível sem riscos. Ela dura de 9 a 10 meses e o intervalo entre partos pode ser de cerca de 12 meses, para aumentar a produção. Uma vida inteira prenhe.
Como todas as vacas, Luma tem um olhar muito expressivo e essa é base para a cineasta criar seu filme: a câmera sempre muito próxima a ela, nos ajuda a entender suas emoções diante de uma rotina desgastante de anos e anos, praticamente nos colocando em sua posição. Seu corpo, apesar do meu uso de pronome possessivo, não lhe pertence. Luma não é um ser vivo, é uma mercadoria, assim como o leite que produz.
Luma precisa ser emprenhada para gerar leite, mas seu filhote é tirado dela logo após as primeiras mamadas. O leite deve ir para as máquinas e o bebê, isolado, recebe mamadeira. Luma sente raiva, grita, chama por ele, tenta bater em quem se aproxima. Ela se revolta e quem assiste também. O olhar parado é de tristeza, enquanto chafurda na lama do espaço confinado.
A montagem primorosa, que condensa o tempo dispendido ao lado da vaca, constrói o ritmo da repetição incessante que caracteriza a exploração. O resultado é o senso de imersão em uma das indústrias que devem estar entre as mais cruéis para animais não-humanos.
No twitter eu escrevi “Fazia tempo que eu não chorava tanto do início ao fim de um filme como com Cow”. É fato, chorei lavado. Profundamente emocionante, com uma poética muito própria, sem jamais ser apelativo, o filme não precisa de letreiros, de narração ou de nada que lembre outros documentários com pé mais fincado no ativismo para nos sensibilizar. Basta Luma.