Gilda Nomacce é LILITH em curta de Edem Ortegal
Tive a sorte de, em meio a minha pesquisa de mestrado sobre o mito de Lilith, descobrir este curta fantástico de Edem Ortegal, ainda por cima estrelado pela deusa Gilda Nomacce, minha ídola dos filmes da Juliana Rojas.
Foi uma surpresa ver como a história foi bem representada mais uma vez nas telas (beijo Monica Demes), desde os intertítulos que apresentam o contexto histórico da primeira mulher a habitar a Terra, apagada de forma conveniente pela Bíblia, até o impactante e derradeiro ritual satânico: “Lilith foi amaldiçoada por Deus, expulsa do paraíso e jogada ao inferno. Agora ela está de volta, com seus servos e sua sede de vingança”. Pois sim, cansada de ler notícias sobre feminicídio em seu celular que introduz o deslocamento temporal, Lilith não quer equidade de gênero, quer se vingar das opressões do patriarcado e instaurar seu Reinado Vermelho.
No primeiro ato Lilith surge pacata, com roupas masculinizadas, pintando quadros sozinha em seu ateliê. Relógios antigos na ambientação toda avermelhada marcam o tempo DELA, candelabros refletem que a vampira canibal se mantém presa ao passado. Na geladeira negra, a carne sangrenta regada a vinho não a satisfaz. A cena tão destoante pressupõe que houve um despertar de seu desejo, possivelmente a partir da nostalgia despertada ao olhar um vestido gótico de épocas passadas.
Suas unhas longas e bem pontudas e os olhos possuídos totalmente negros conferem monstruosidade ao corpo feminino. Subversiva e dona também de suas vontades, deixa claro não ficar por baixo de homem nenhum, não permitindo que a rejeição de Adão se repita. Só fica saciada quando coberta de sangue. Os closes com iluminação vermelha na estátua de Vênus de Milo tornam impossível não lembrar de Twin Peaks, assim como o take da lua cheia (outra forma lilithiana) que se move no céu.
Em sua banheira sangrenta rodeada por velas pretas, cultua o feminino com um símbolo rosa em neon na parede. Eis que se aproxima o Ancângelo Rafael, alegando parentesco, para tentar buscá-la sem sucesso, como fizeram os três mensageiros enviados por Saturno no Zohar. Mas Lilith não é submissa como Eva, que aceitava ser chamada de costela de outro homem.
O Jardim do Eden é pequeno demais para sua independência e desobediência transgressora. No longa futurista, há espaço ainda para uma crítica política de como a cultura paternalista busca o controle do corpo das mulheres e acredita em tudo na TV, aspecto que torna ainda mais sensata a escolha de localizar a morada de Lilith no Brasil. Lilith sádica pretende ser trazer o Príncipe das Trevas ao mundo… mas porque não trazer A Anticristo pra variar?
“Bode rebelde que saiu do seu rebanho”
https://stephaniaamaral.wordpress.com/2018/08/23/gilda-nomacce-e-lilith-em-curta-de-edem-ortegal/