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Todo Tempo que Temos (We Live in Time, 2024)

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Direção: John Crowley

Sinpse: Almut e Tobias são unidos por um encontro surpresa que muda suas vidas. Ao embarcarem em um caminho desafiado pelos limites do tempo, eles aprendem a valorizar cada momento de sua história de amor não convencional.

Comentário: Almut (Florence Pugh), ou simplesmente Al, é apresentada no começo do filme como uma chefe de cozinha de sucesso, feliz no casamento com Tobias (Andrew Garfield) e tem uma filha pequena. É o resumo do “ela tem tudo”. E aí ela descobre que tem um câncer no útero. A história do casal é apresentada em flashback. Ambos tinham 30 e poucos anos quando ele saiu para comprar uma caneta para assinar seu divórcio e ela o atropelou. Um meet cute hospitalar.

Daí em diante, eles embarcam numa relação em que ela é sempre apresentada como a fora da norma. Ela não quer se casar (e de fato, no tempo presente, eles não são casados), ela é competitiva, ela já foi atleta premiada, ela não quer ter filhos, a ex dela é uma mulher. De Tobias pouco sabemos: só que é recém divorciado, trabalha numa empresa que fabrica cereais matinais e quer ter filhos. Todo esse foco em aspectos da vida e personalidade de Al é curioso, visto que ela é, afinal, um mecanismo narrativo que serve a Tobias. Como toda Manic Pixie Dream Girl, ela existe para mudar profundamente a vida banal que ele vive. Para isso, o flashback nos conduz a diversos momentos do seu relacionamento. Vemos brigas e alegrias.

É possível enxergar exatamente a forma como o roteiro intercala momentos que emocionam com aqueles que levam às risadas. A sequência do parto da filha dos dois é muito boa justamente por entrelaçar os dois com intensidade. No tempo presente, eles têm que lidar com o tratamento e a perspectiva do fim, aproveitando cada momento, como o título indica. Pugh brilha mesmo em um material que não parece desafiá-la, nem está à altura de suas capacidades como atriz. Garfield tem exatamente a mesma expressão o filme inteiro, com um leve sorriso nos lábios e os olhos úmidos com lágrimas. Como romance, tenho certeza que vai ser sucesso imediato.

Crowley sabe dosar a emoção e construir a beleza de uma rotina entre os protagonistas (e eu mesma gosto de Brooklyn acima da média entre o público). O problema é que toda a narrativa é construída sobre uma lógica insustentável. O flashback revela que o câncer já existia anos antes. Al tinha duas escolhas: histerectomia e quimioterapia (a mais segura) ou manter o útero e fazer químio, pensando em uma futura gravidez, sabendo que haveria a chance do câncer voltar. Tobias sonhava em ser pai. Al nunca quis ser mãe. Ela optou pela segunda com o argumento de que poderia mudar de ideia (e de fato foi o que aconteceu).

Al escolheu se sacrificar para que o companheiro realizasse o sonho de paternidade e em nenhum momento do filme se menciona a palavra “adoção”. É como se não existisse, não fosse uma possibilidade nesse universo. A única forma dele se realizar é usando o útero dela, que se doa para esse intento. E diante disso, toda a construção emocional do filme se torna vã, porque é impossível se conectar com uma história construída sobre essa premissa. Todo Tempo Que Temos estabelece uma boa química entre os protagonistas e tem seus bons momentos. Infelizmente tudo é descartado por uma premissa absurda.

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Crítica de cinema, doutora em Antropologia Social, pesquisadora de corpo, gênero, sexualidade e cinema.

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