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[44ª Mostra de São Paulo] Feels Good Man

Esta crítica faz parte da cobertura da 44ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, que ocorre entre 22 de outubro e 4 de novembro em formato online.

Quando a arte vai para o mundo, ela deixa de ser do artista. Isso fica muito claro do documentário Feels Good Man, vencedor de um prêmio especial do júri de melhor cineasta estreante para o diretor Arthur Jones, no Festival de Sundance. O filme mostra a trajetória do sapo antropomorfizado Pepe, que foi criado pelo cartunista Matt Furie.

Pepe ganhou seu próprio gibi virtual em 2005, o Boy’s Club. Ele e seus amigos formavam um quarteto de (animais) recém-formados, ainda não estabelecidos na vida. As tirinhas eram publicadas em sites como o MySpace e uma, em específico, em que o personagem fazia xixi com as calças abaixadas até o tornozelo e falava “feels good man” (algo como “é bom, cara”, em tradução aproximada), viralizou.

A partir do momento em que o Pepe caiu nos redutos do 4chan, por meio de prints de pedaços dos quadrinhos, Matt Furrie perdeu o controle sobre o material que criou. Primeiro ele se instalou em fóruns de bodybuilders, depois passou para os grupo de jovens rapazes que não trabalham nem estudam e, por fim, se tornou um símbolo da extrema direita, dos neo-nazistas e dos supremacistas brancos.

O documentário apresenta em detalhes cada etapa do processo de memeficação do sapo e o desespero de seu criador. É impossível não sentir por ele que, como foi definido por um jornalista em seu depoimento, “parece bem intencionado mas um pouco ingênuo” sobre como se deu todo esse processo.

Trata-se de uma espécie de conto de alerta sobre a impossibilidade de impedir que a arte, uma vez criada, independente das intenções de quem a cria, seja apropriada e ressignificada. É, também, um ótimo filme para entender como funcionam os fóruns anônimos da internet e as maneiras como a extrema direita se faz atraente para jovens, especialmente homens, desesperançosos. Embora Feels Good Man não inove no formato, é um documentário não só interessante aos revelar as engrenagens desses grupos, mas também um filme agradável, apesar de tudo, de assistir.

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Crítica de cinema, doutora em Antropologia Social, pesquisadora de corpo, gênero, sexualidade e cinema.

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