Cinema
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A Música da Minha Vida
A maior parte da filmografia da cineasta Gurinder Chadha, de origem indiana mas que mora no Reino Unido, trata de questões pós-coloniais, especialmente de mulheres indianas e sua relação com a metrópole, abarcando, com isso, relações de gênero e sexualidade além de raça, etnia e nacionalidade. Escrevendo dessa forma parece que seus filmes são complexos tratados de antropologia, mas na verdade são obras leves e agradáveis, como Driblando o Destino (Bend It Like Beckham, 2002) e Noiva e Preconceito (Bride and Prejudice, 2004). Em A Música da Minha Vida (Blinded By the Light, 2019), baseado em uma história real, o protagonista, dessa vez, é um garoto. Javed é um menino…
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Os Jovens Baumann
No ano de 1992 os oito primos, todos da família Baumann, se reúnem em sua fazenda para passar as férias. São os herdeiros do local, em Santa Rita do Oeste, Minas Gerais. Nós, em 2019, revisitamos suas conversas, caminhadas, brincadeiras e interações por meio das filmagens em VHS feitas por Isa, a prima que nunca aparece diante das câmeras. Os Jovens Baumann, filme de estreia de Bruna Carvalho Almeida, acaba por conectar dois momentos distintos: o passado fictício recriado com detalhes como um found footage e o presente de quem o assiste. A mediação entre eles é feita por uma narradora em off que se apresenta como alguém que tinha…
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Rainha de Copas
Anne (Trine Dyrholm) é uma bem sucedida advogada que trabalha em casos de violência contra menores. Casada com um médico, mãe de duas filhas gêmeas e moradora de uma imensa casa com grandes panos de vidro rodeada por um bosque, ela parece ter uma vida perfeita. Mas a chegada de seu enteado, o adolescente Gustav (Gustav Lindh), desestabiliza sua rotina. Gustav, que enfrenta problemas na escola, aceitou terminar o ano letivo morando com o pai. Mas o que ele traz para a vida de Anne é toda uma nova vivacidade que contrapõe sua rotina. Ela é invisível para seu marido e as interações entre os dois são de um distanciamento…
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Minha Lua de Mel Polonesa
Fotos antigas que guardam recordações de antepassados que sequer conhecemos: assim começa o filme Minha Lua de Mel Polonesa. A diretora, Élise Otzenberger, que também roteirizou o filme, tem muito em comum com a protagonista, a francesa Anna (Judith Chemla). Assim como ela, é de família judia de origem polonesa e pouco sabe sobre eles, em virtude das vidas e histórias dizimadas durante o Holocausto. Anna, que é casada com Adam (Arthur Igual) e tem um bebê de um ano de idade, pede aos seus pais que cuidem da criança por alguns dias para que o casal viagem para a Polônia. A ideia é que tenham tempo para si, mas…
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Bacurau
Que roupa é essa menino? Spoilers moderados à frente Bacurau, dirigido por Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles, é significativo em meio ao cenário político brasileiro de 2019, retratando processos e atores sociais que são muito próximos de nossa realidade, mas moldando-os em um complexo e instigante hibridismo de gênero. A história se desenrola na cidadezinha também chamada Bacurau, no Oeste de Pernambuco. A localização não é por acaso, pois o faroeste (sertanejo) se desenrolará por ali. Longe demais das capitais, a população local está abandonada à sorte de um prefeito almofadinha, Tony Jr (Thardelly Lima) que só é capaz de lhes fornecer alimentos e medicações vencidos, alguns significativos caixões…
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Rainhas do Crime (The Kitchen, 2019)
A música da abertura do filme dita o tom da história: “this is a men’s world” brada a versão da melodia de James Brown. É o final na década de 1970, em Hell’s Kitchen, na cidade de Nova York. Nesse mundo dos homens, três mafiosos são presos em uma ação do FBI, deixando suas esposas Kathy (Melissa McCarthy), Ruby (Tiffany Haddish) e Claire (Elisabeth Moss) sem um resguardo financeiro. A primeira é a esposa amorosa e mãe de dois filhos; a segunda, vítima de violência doméstica; e terceira precisa lidar cotidianamente com o racismo da família de seu marido branco. A máfia a que pertenciam prometeu cuidar delas mas o…
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Rafiki (2018)
Romeu e Julieta: duas pessoas jovens de famílias com rivalidades políticas se apaixonam e querem ficar juntas. Essa é a premissa de Rafiki, filme queniano dirigido por Wanuri Kahiu. As protagonistas são Kena (Samantha Mugatsia) e Ziki (Sheila Munyiva), ambas filhas de dois homens candidatos nas eleições locais e moradoras do mesmo conjunto habitacional. Ziki vê Kena no bar com os amigos ou andando de skate pela rua e Kena vê Ziki treinando coreografias na rua com as amigas. Elas se aproximam, criam laços e se apaixonam. Como muitos romances focados em personagens LGBT, isso não acontece sem turbulências. No Quênia, relacionamentos entre pessoas do mesmo gênero não só são…
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Estou me Guardando para Quando o Carnaval Chegar
A cidade de Toritama, no agreste pernambucano, tem apenas 40 mil habitantes mas produz cerca de 20% do jeans nacional, o que equivale a 20 milhões de peças por ano. Apelidada de capital do jeans, ela é a locação para o documentário Estou me Guardando para Quando o Carnaval Chegar (2019), dirigido por Marcelo Gomes. Com uma narração em off que dialoga com quem assiste, o diretor retrata com proximidade e não sem espanto alguns aspectos da realidade econômica local. Segundo ele, décadas antes visitara a cidade junto com seu pai, que trabalhava para o governo. Tanto o pai como a mãe são nascidos na região. O que existia, então,…
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Filmes dirigidos por mulheres na Netflix
O primeiro semestre acabou e chegamos à metade do ano. Nessa época muitas vezes as pessoas adeptas da cinefilia fazem suas listas de melhores filmes desse período e começam a pensar naqueles que ficaram para trás. A Netflix tem um catálogo imenso de filmes e muitas vezes é difícil de conseguir localizar o que chegou de novidade ao serviço de streaming. Para quem faz o desafio #52FilmsByWomen complica conseguir acompanhar as opções disponíveis. Pensando nisso, separei todos os filmes que são lançamentos do catálogo brasileiro, disponibilizados entre janeiro e junho e que são dirigidos ou co-dirigidos por mulheres. Segue a lista, já com o link que leva para o respectivo…
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Toy Story 4
Talvez eu não devesse ter revisto todos os Toy Story antes de ver esse quarto. Rever o primeiro, lançado em 1995, me deixou com a triste impressão de que Woody era, então um brinquedo que encarnava o papel de masculinidade branca e cisgênero, ao contrário de outros brinquedos que não eram antropomórficos. Woody estava satisfeito no seu local de privilégio como o preferido de Andy, sem se importar com o status secundário dos demais. Até o dia que Buzz Lightyear, uma versão mais aprimorada de masculinidade branca e cisgênero chega para ocupar o seu lugar. Toda a história é sobre esse personagem privilegiado dentre os demais e que não quer…