Críticas e indicações

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    Mickey 17 (2025)

    “Dizem que dão emprego para aquele rio de pessoas que segue para o norte. O presidente Donner é a favor deles. Os trabalhadores são mais descartáveis do que escravos. Eles inspiram fumaça tóxica, bebem água contaminada ou são feridos em máquinas sem proteção… Não importa. São fáceis de substituir: milhares de desempregados para cada vaga”. (A Parábola do Semeador, de Octavia E. Butler, p. 402) Assistir Mickey 17, novo filme do cineasta coreano Bong Joon-ho, na mesma semana em que li A Parábola do Semeador, livro de Octavia Butler, foi uma confluência (e coincidência) bastante apropriada. O livro foi publicado em 1993 e reflete muitas das angústias da época, e…

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    Nazismo e perseguição a identidades LGBTQIA+ no cinema

    Publicado originalmente em 06/02 na newsletter para assinantes do financiamento coletivo do Feito por Elas. Para contribuir, assine aqui. Tenho assistido com estupefação, como quase todo mundo, as tomadas de decisão de Donald Trump, novamente ocupando a cadeira da Casa Branca. Nem vou falar do horror que são os descalabros do Elon Musk. Mas uma das coisas que mais têm me afetado é ver as notícias sobre a perseguição de identidades transgênero pelo governo. Primeiro o secretário de Estado Marco Rubio proibiu a emissão de passaportes com identidade retificada para pessoas transgênero. Eu vi muita gente apavorada no bluesky, constatando que ou utiliza o nome morto e o gênero designado no nascimento, ou está…

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    O Piano e a mulher selvagem de Clarissa Pinkola Estés

    “A Mulher Selvagem ensina às mulheres quando não se deve ser ‘boazinha’ no que diz respeito à proteção da expressão de nossa alma. A natureza selvagem sabe que a ‘doçura’ nessas ocasiões só faz com que o predador sorria. Quando a expressão da alma está sendo ameaçada, não é só aceitável fixar um limite e ser fiel a ele; é imprescindível”. Mulheres que correm com lobos, Clarissa Pinkola Estés – Capítulo 02 – A tocaia ao intruso: O princípio da iniciação Há uma cena em O Piano, filme roteirizado e dirigido por Jane Campion, em que Ada (Holly Hunter) assiste a uma peça de teatro que encena o conto do Barba-Azul. A história…

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    Bridget Jones: Louca pelo Garoto (2025)

    Antes de tudo devo dizer que não tenho isenção alguma para escrever sobre esse filme. A primeira vez que eu li o primeiro livro, O Diário de Bridget Jones, de Helen Fielding, foi em 2001, quando tinha 16 anos. Eu e mais sete amigos nos juntamos para dar de presente de aniversário para outra amiga. Livro novo, preço de capa, a gente com essa idade, essa era a forma que sempre fazíamos em todos os aniversários: juntar para comprar de galera. Pois bem, depois de devidamente presenteado, o livro rodou pelas mãos de quem presenteou também e assim foi minha primeira leitura. A segunda deve ter sido da biblioteca. E…

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    Homens de Barro (2024)

    Com nomes incomuns e uma narração em off descrevendo suas histórias, dois meninos, Pássaro e Marciano, vivem vidas normais, até certo ponto, de crianças em uma cidade muito pequena, com mais natureza do que perspectivas. No entanto, a história de Homens de Barro não pretende de forma alguma se distanciar ou esconder sua referência shakesperiana, sublinhando uma proximidade com a literatura e com a tragédia. Assim, a voz que descobre-se mais tarde ser de Ângelo (João Pedro Prates), o irmão que era pouco relevante na introdução do longa, narra como sua família, os Miranda, travam uma rivalidade de anos com os Tamai, poeticamente situados lado a lado, vizinhos de casa…

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    Os Sapos (2024)

    Lentamente uma mulher caminha sozinha por uma estrada rural, carregando sua mala, até chegar em uma simpática casa de pau a pique rodeada por vegetação. No interior, Luciana (Karina Ramil) fez pão e toma um café da manhã caprichado e cheio de chamego com Marcelo (Pierre Santos). A chegada da estranha interrompe o que seria um descanso a dois. Paula (Thalita Carauta), a visitante, diz que veio para o encontro marcado por Marcelo. Ele havia chamado um grupo de amigos da juventude, que não via há 20 anos, para um fim de semana bucólico. Segundo ele, era um engano, pois desmarcou com todos para ficar apenas com sua companheira. Paula…

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    Parque de Diversões (2024)

    É noite na cidade, pessoas caminham de diversas direções até um mesmo ponto central. A escuridão urbana contorna os rostos, ninguém diz nada, ninguém tem nome, nem história, mas seus rostos são bem retratados, em foco. Quando a primeira personagem chega aos portões e os rompe, abre-se um novo mundo, resgatando um lado mais animalesco do instinto sexual, até por isso a primeira pessoa a desbravar o parque o faz justamente subindo em uma árvore. Parque de Diversões inicia então sua observação voyeur, convidando a pessoa espectadora a participar de um jogo entre diferentes experiências, mas com seu ritmo bem estabelecido entre as preliminares e o ápice. Os personagens praticamente…

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    Alma do Deserto (2024)

    Co-produção colombiana e brasileira, Alma do Deserto (Alma del Desierto, 2024) retrata uma mulher em busca de seus direitos. Georgina Epiayú, a protagonista, é uma mulher indígena da etnia Wayúu que quer obter um documento de identidade para, assim, poder votar nas eleições nacionais que se aproximam. Algo que o filme revela é sua transgeneridade e os obstáculos burocráticos que lhe são impostos. Georgina mora sozinha em uma casa isolada em um deserto da região de La Guajira. Seu isolamento geográfico e a aridez da paisagem, apesar da beleza, parecem funcionar como uma espécie de metáfora para sua própria situação legal. Talvez por isso a diretora, a também antropóloga Monica Taboada-Tapia,…

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    Immortality

    A atriz Marissa Marcel fez 3 filmes: Ambrosio, em 1968; Minsky, em 1970 e Two of Everything, em 1999. Nenhum deles foi lançado e ela desapareceu. Onde está Marissa Marcel? Essa é a premissa do jogo Immortality, lançado em 2022, que me deixou completamente fisgada. O jogo atrai quem gosta cinema por meio de toda a construção que faz de ambientes, narrativas (e narrativas dentro das narrativas) e referências. Ambrosio é adaptado de um romance gótico real, escrito por Matthew Lewis em 1796. O cartaz remete ao de Anatomia de um Crime (1959) criado por Saul Bass. O filme dentro do jogo, por sua vez, se ambienta em um monastério…

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    Sem Chão (Losing Ground, 1982)

    Este texto faz parte da cobertura do 13º Festival Internacional Olhar de Cinema de Curitiba, que ocorre entre 12 a 20 de junho. “Não exiba seu pênis como se fosse um pincel. Acho que é isso que me falta, porque não tenho nada para botar para fora.” O êxtase, o transe, a sensação de ir ao céu e voltar. Essa percepção mística, quase que espiritual, é buscada inconscientemente pelo ser humano nas mais diversas esferas. Na religião, nos rituais, esse ápice é a aproximação com a entidade superior buscada, é o espaço interior que vai dar algum sentido à existência. Para o artista, em especial, talvez essa seja uma constante…