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Sobre cineastas e grandes orçamentos

Tem certas coisas que, quando vemos, só dá pra dizer, como se fala na minha terra, que é de cair o c* da bunda. Perdoem-me a finesse. É o caso do tuíte abaixo, do Hollywood Reporter.


#acessível:
Twitter do Hollywood Reporter onde se lê “#MulherMaravilha Warner Bros. está apostando 150 milhões de dólares em uma cineasta cujo único crédito anterior no cinema foi um filme indie de 8 milhões”.
Twitter de Scott Beggs respondendo: “Contexto: mulher faz um sucesso de crítica e e de bilheteria que ganha um Oscar… Tem que esperar fodidos 14 anos para ser contratada para um longa de novo”.

Galera do Hollywood Reporter acha que a Warner fez caridade? Isso aí é investimento! Quantas diretoras conseguem filmes com altos orçamentos? Acima dos 100 milhões, até hoje, só Kathryn Bigelow, com K-19 (2002), Lana e Lilly Wachowski comA Viagem (2012) e O Destino de Júpiter (2015) e recentemente Ava DuVernay com Uma Dobra no Tempo (ainda em produção). Enquanto isso garotos branco de 20 e poucos anos que dirigiram filmes indies bem avaliados são convidados a dirigir outros com orçamentos milionários em grandes franquias.

E quanto tempo diretoras com filmes de pequeno orçamento mas grande impacto, levam para conseguir outro trabalho? A própria Patty Jenkins, cujo Monster (2002) garantiu o Oscar de melhor atriz para Charlize Theron, voltou apenas agora com Mulher Maravilha, depois de alguns anos em seriados como The Killing e Arrested Development. Onde está Lisa Cholodenko, que garantiu 4 indicações ao Oscar (melhor filme, melhor atriz, melhor ator coadjuvante e melhor roteiro original) com o filme Minhas Mães e Meu Pai (2010), com orçamento de apenas 3 milhões? Na televisão, em seriados. Lynne Ramsay, que em 2011 lançou seu elogiado Precisamos Falar Sobre o Kevin, orçado em 7 milhões, indicado ao BAFTA de melhor filme, melhor filme britânico e melhor direção, reapareceu só esse ano com You Were Never Really Here (e ganhou com ele o prêmio de melhor roteiro e melhor ator em Cannes). E já faz 6 anos que Dee Rees lançou Pariah e desde lá está na televisão. Esses são apenas alguns exemplos notórios, mas são muitas e é fácil perceber esse padrão de dificuldade.

Dizer que um estúdio está apostando caro ao contratar qualquer uma dessas diretoras é um malabarismo argumentativo, já que diretores homens com o mesmo tipo de currículo são constantemente premiados com orçamentos milionários em seu próximo trabalho (Gareth Edwards, Rian Johnson, Colin Trevorrow e mesmo Josh Trank com o desastroso Quarteto Fantástico são exemplos recentes). O que existe é uma constante dificuldade de mulheres que dirigem conseguirem financiamento ou contrato para seu filme seguinte. Existe uma exclusão sistemática de todo um nicho de trabalhadores, especificamente em virtude de seu gênero.

E por isso também que um filme como Mulher Maravilha, um blockbuster de heroína, é tão importante politicamente. Ele já é um sucesso absoluto de crítica (é o melhor desempenho de filme de super herói da Marvel ou da DC já feito) e agora precisa garantir no fim de semana de estreia uma bilheteria considerável, para mostrar que as cineastas fazem valer a qualidade de seu trabalho no orçamento investido, sem apostas incertas.

 

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Crítica de cinema, doutora em Antropologia Social, pesquisadora de corpo, gênero, sexualidade e cinema.

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